— QUEM diria que a gente do Palha nos trataria deste modo? Já não valemos nada.
Escusa de o defender...
— Não defendo, estou explicando; há de ter havido confusão...
— Fazer anos, casar a prima, e nem um triste convite ao major, ao grande major,
ao impagável major, ao velho amigo major. Eram os nomes que me davam; eu era
impagável, amigo velho, grande e outros nomes. Agora, nada, nem um triste convite,
um recado de boca, ao menos, por um moleque: “Nhanã faz anos, ou casa a prima, diz
que a casa está às suas ordens e que vão com luxo”. Não iríamos; luxo não é para nós.
Mas era alguma coisa, era recado, um moleque, ao impagável major...
— Papai!
Rubião, vendo a intervenção de Dona Tonica, animou-se a defender longamente
a família Palha. Era em casa do major, não já na Rua Dois de Dezembro, mas na Dos
Barbonos, modesto sobradinho. Rubião passava, ele estava à janela, e chamou-o. Dona
Tonica não teve tempo de sair da sala, para dar, ao menos, uma vista d´olhos ao espelho;
mal pôde passar a mão pelo cabelo, compor o laço de fita ao pescoço e descer o vestido
para cobrir os sapatos, que não eram novos.
— Digo-lhe que pode ter havido confusão, insistiu Rubião; tudo anda por lá
muito atrapalhado com esta comissão das Alagoas.
— Lembra bem, interrompeu o major Siqueira; por que não meteram minha
filha na comissão das Alagoas? Qual! Há já muito que reparo nisto; antigamente não se
fazia festa sem nós. Nós éramos a alma de tudo. De certo tempo para cá começou a
mudança; entraram a receber-nos friamente, e o marido, se pode esquivar-se, não me
cumprimenta. Isto começou há tempos; mas antes disso sem nós é que não se fazia nada.
Que esta o senhor a falar de confusão? Pois se na véspera dos anos dela, já desconfiando
que não nos convidariam, fui ter com ele ao armazém. Poucas palavras; disfarçava.
Afinal disse-lhe assim: “Ontem, lá em casa, eu e Tonica estivemos discutindo sobre a
data dos anos de Dona Sofia; ela dizia que tinha passado, eu disse que não, que era hoje
ou amanhã.” Não me respondeu, fingiu que estava absorvido em uma conta, chamou o
guarda-livros, e pediu explicações. Eu entendi o bicho, e repeti a história; fez o mesma
coisa. Saí. Ora o Palha, um pé-rapado! Já o envergonho. Antigamente: major, um
brinde. Eu fazia muitos brindes, tinha certo desembaraço. Jogávamos o voltarete. Agora
está nas grandezas; anda com gente fina. Ah! vaidades deste mundo! Pois não vi outro
dia a mulher dele, num cupé, com outra? A Sofia de cupé! Fingiu que não me via, mas
arranjou os olhos de modo que percebesse se eu a via, se a admirava. Vaidades desta
vida! Quem nunca comeu azeite, quando come se lambuza.
— Perdão, mas os trabalhos da comissão exigem certo aparato.
— Sim, acudiu Siqueira, é por isso que minha filha não entrou na comissão; é
para não estragar as carruagens...
— Demais, o cupé podia ser da outra senhora que ia com ela.
O major deu dois passos, com as mãos para trás, e de Rubião.
— Da outra... ou do padre Mendes. Como vai o padre? Boa vida, naturalmente.
— Mas papai, pode não haver nada, interrompeu Dona Tonica. Ela sempre me
trata bem, e quando estive doente no mês passado, mandou saber pelo moleque, duas
vezes...
— Pelo moleque! bradou o pai. Pelo moleque! Grande favor! “Moleque, vai ali a
casa daquele reformado e pergunta-lhe se a filha tem passado melhor; não vou, porque
estou lustrando as unhas! Grande favor! Tu não lustras as unhas! tu trabalhas!” tu és
digna filha minha! pobre, mas honesta!
Aqui o major chorou, mas suspendeu de repente as lágrimas. A filha, comovida,
sentiu-se também vexada. Certo, a casa dizia a pobreza da família; poucas cadeiras, uma
mesa redonda velha, um canapé gasto; nas paredes duas litografias encaixilhadas em
pinho pintado de preto, uma era o retrato do major em 1857, a outra representava o
Veronês em Veneza, comprado na Rua do Senhor dos Passos. Mas o trabalho da filha
transparecia em tudo; os móveis reluziam de asseio, a mesa tinha um pano de crivo,
feito por ela, o canapé uma almofada. E era falso que Dona Tonica não lustrasse as
unhas; não teria o pó nem a camurça, mas acudia-lhes com um retalho de pano todas as
manhãs.
CAPÍTULO CXXXI
RUBIÃO tratou-os com simpatia. Não continuou a defender a gente Palha, para não
desesperar o major. Pouco depois, despediu-se. prometendo, sem convite, que lá iria
jantar “um dia destes”.
— Jantar de pobre, acudiu o major; se puder avisar, avise.
— Não quero banquetes; virei quando me der na cabeça.
Despediu-se. Dona Tonica, depois de ir até o patamar, sem chegar à frente por
causa dos sapatos, foi à janela para vê-lo sair.
CAPÍTULO CXXXII
LOGO que Rubião dobrou a esquina da Rua das Mangueiras, Dona Tonica entrou e foi
ao pai, que se estendera no canapé, para reler o velho Saint-Clair das ilhas ou os dos
desterrados da ilha da Barra. Foi o primeiro romance que conheceu; o exemplar tinha
mais de vinte anos; era toda a biblioteca do pai e da filha. Siqueira abriu o primeiro
volume, e deitou os olhos ao começo do capítulo II, que já trazia de cor. Achava-lhe
agora um sabor particular, por motivo dos seus recentes desgostos: “Enchei bem os
vossos copos, exclamou Saint-Clair, e bebamos de uma vez; eis o brinde que vos
proponho. À saúde dos bons e valentes oprimidos, e ao castigo dos seus opressores.
Todos acompanharam Saint-Clair, e foi de roda a saúde.”
— Sabe de uma coisa, papai? Papai compra amanhã latas de conserva, petit-pois,
peixe, etc., e ficam guardadas. No dia em que ele aparecer para jantar, põe-se no fogo, é
só aquecer, e daremos um jantarzinho melhor.
— Mas eu só tenho o dinheiro do teu vestido.
— O meu vestido? Compra-se no mês que vem, ou no outro. Eu espero.
— Mas não ficou ajustado?
— Desajusta-se; eu espero.
— E se não houver outro do mesmo preço?
— Há de haver; eu espero, papai.
CAPÍTULO CXXXIII
AINDA não disse, — porque os capítulos atropelam-se debaixo da pena, — mas aqui
está um para dizer que, por aquele tempo, as relações de Rubião tinham crescido em
número. Camacho pusera-o em contato com muitos homens políticos, a comissão das
Alagoas com várias senhoras, os bancos e companhias com pessoas do comércio e da praça, os teatros com alguns freqüentadores e a Rua do Ouvidor com toda a gente. Já
então era um nome repetido. Conhecia-se o homem. Quando apareciam as barbas e o
par de bigodes longos, uma sobrecasaca bem justa, um peito largo, bengala de
unicórnio, e um andar firme e senhor, dizia-se logo que era o Rubião, um ricaço de
Minas.
Tinham-lhe feito uma lenda. Diziam-no discípulo de um grande filósofo, que lhe
legara imensos bens, — um, três, cinco mil contos. Estranhavam alguns que ele não
tratasse nunca de filosofia, mas a lenda explicava esse silêncio pelo próprio método
filosófico do mestre, que consistia em ensinar somente aos homens de boa vontade.
Onde estavam esses discípulos? Iam à casa dele, todos os dias. — alguns duas vezes de
manhã e de tarde; e assim ficavam definidos os comensais. Não seriam discípulos, mas
eram de boa vontade. Roíam fome, à espera, e ouviam calados e risonhos os discursos
do anfitrião. Entre os antigos e os novos, houve tal ou qual rivalidade, que os primeiros
acentuaram bem, mostrando maior intimidade, dando ordens aos criados, pedindo
charutos, indo ao interior, assobiando, etc. Mas o costume os fez suportáveis entre si, e
todos acabaram na doce e comum confissão das qualidades do dono da casa. Ao cabo de
algum tempo, também os novos lhe deviam dinheiro, ou em espécie, — ou em fiança no
alfaiate, ou endosso de letras, que ele pagava às escondidas, para não vexar os
devedores.
Quincas Borba andava ao colo de todos. Davam estalinhos, para vê-lo saltar;
alguns chegavam a beijar-lhe a testa; um deles, mais hábil, achou modo de o ter à mesa,
ao jantar ou almoço, sobre as pernas, para lhe dar migalhas de pão.
— Ah! isso não! protestou Rubião à primeira vez.
— Que tem? retorquiu o comensal. Não há pessoas estranhas.
Rubião refletiu um instante.
— Verdade é que está aí dentro um grande homem, disse ele.
O filósofo, o outro Quincas Borba, continuou o conviva, circulando o olhar pelos
novatos, para mostrar a intimidade das relações entre ele e Rubião; mas, não logrou
sozinho a vantagem, porque os outros amigos da mesma era, repetiram, em coro:
— É verdade, o filósofo.
E Rubião explicou aos novatos a alusão ao filósofo, e a razão do nome do cão,
que todos lhe atribuíam. Quincas Borba (o defunto) foi descrito e narrado como um dos
maiores homens do tempo, — superior aos seus patrícios. Grande filósofo, grande alma,
grande amigo. E no fim, depois de algum silêncio, batendo com os dedos na borda da
mesa, Rubião exclamou:
— Eu o faria ministro de Estado!
Um dos convivas exclamou, sem convicção, por simples ofício:
— Oh! sem dúvida!
Nenhum daqueles homens sabia, entretanto, o sacrifício que lhes fazia o Rubião.
Recusava jantares, passeios, interrompia conversações aprazíveis, só para correr a casa e
jantar com eles. Um dia achou meio de conciliar tudo. Não estando ele em casa às seis
horas em ponto, os criados deviam pôr o jantar para os amigos. Houve protestos; não,
senhor, esperariam até sete ou oito horas. Um jantar sem ele não tinha graça.
— Mas é que posso não vir, explicou Rubião.
Assim se cumpriu. Os convivas ajustaram bem os relógios pelo da casa de
Botafogo. Davam seis horas, todos à mesa. Nos dois primeiros dias houve tal ou qual
hesitação; mas os criados tinham ordens severas. Às vezes, Rubião chegava pouco
depois. Eram então risos, ditos, intrigas alegres. Um queria esperar, mas os outros... Os
outros desmentiam o primeiro; ao contrário, foi este que os arrastou, tal fome trazia, —
a ponto que, se alguma coisa restava, eram os pratos. E Rubião ria com todos.
CAPÍTULO CXXXIV
Fazer um capítulo só para dizer que, a princípio, os convivas, ausente o Rubião,
fumavam os próprios charutos, depois do jantar, — parecerá frívolo aos frívolos; mas os
considerados dirão que algum interesse haverá nesta circunstância em aparência
mínima.
De fato, uma noite, um dos mais antigos lembrou-se de ir ao gabinete de Rubião;
lá fora algumas vezes, ali se guardavam as caixas de charutos, não quatro nem cinco,
mas vinte e trinta de várias fábricas e tamanhos, muitas abertas. Um criado (o espanhol )
acendeu o gás. Os outros convivas seguiram o primeiro, escolheram charutos e os que
ainda não conheciam o gabinete admiraram os móveis bem feitos e bem dispostos. A
secretária captou as admirações gerais; era de ébano, um primor de talha, obra severa e
forte. Uma novidade os esperava: dois bustos de mármore, postos sobre ela, os dois
Napoleões, o primeiro e o terceiro.
— Quando veio isto?
— Hoje meio-dia, respondeu o criado.
Dois bustos magníficos. Ao pé do olhar aquilino do tio, perdia-se no vago o
olhar cismático do sobrinho. Contou o criado que o amo, apenas recebidos e colocados
os bustos, deixara-se estar grande espaço em admiração, tão deslembrado do mais, que
ele pôde mirá-los também, sem admirá-los, — No me dicen nada estos dos pícaros,
concluiu o criado fazendo um gesto lago e nobre.
CAPÍTULO CXXXV
RUBIÃO protegia largamente as letras. Livros que lhe eram dedicados, entravam para o
prelo com a garantia de duzentos e trezentos exemplares. Tinha diplomas e diplomas de
sociedades literárias, coreográficas, pias, e era juntamente sócio de uma Congregação
Católica e de um Grêmio Protestante, não se tendo lembrado de um quando lhe falaram
do outro; o que fazia era pagar regularmente as mensalidades de ambos. Assinava
jornais sem os ler. Um dia, ao pagar o semestre de um, que lhe haviam mandado, é que
soube, pelo cobrador, que era do partido do governo; mandou o cobrador ao diabo.
CAPÍTULO CXXXVI
O COBRADOR não foi ao diabo; recebeu o preço do semestre, e, como possuía a
observação natural dos cobradores, resmungou na rua:
— Ora aqui está um homem que detesta a folha e paga. Quantos a adoram e não
pagam!
CAPÍTULO CXXXVII
MAS — ó lance da fortuna! ó eqüidade da natureza! — os desperdícios do nosso amigo,
se não tinham remédio, tinham compensação. Já o tempo não passava por ele como por
um vadio sem idéias. Rubião, à falta delas, tinha agora imaginação. Outrora vivia antes
dos outros que de si, não achava equilíbrio interior, e o ócio esticava as horas, que não
acabavam mais. Tudo ia mudando; agora a imaginação tendia a pousar um pouco.
Sentado na loja do Bernardo, gastava toda uma manhã, sem que o tempo lhe trouxesse
fadiga, nem a estreiteza da Rua do Ouvidor lhe tapasse o espaço. Repetiam-se as visões
deliciosas, como a das bodas (Capítulo LXXXI) em termos a que a grandeza não tirava
a graça. Houve quem o visse, mais de uma vez, saltar da cadeira e ir até a porta ver bem pelas costas alguma pessoa que passava. Conhecê-la-ia? Ou seria alguém que,
casualmente, tinha as feições da criatura imaginária que ele estivera mirando? São
perguntas demais para um só capitulo; basta dizer que uma dessas vezes nem passou
ninguém, ele próprio reconheceu a ilusão, voltou para dentro, comprou uma tetéia de
bronze para dar à filha do Camacho, que fazia anos e ia casar em breve, e saiu.
CAPÍTULO CXXXVIII
E SOFIA? interroga impaciente a leitora, tal qual Orgon: Et Tartufe? Ai, amiga minha, a
resposta é naturalmente a mesma, — também ela comia bem, dormia largo e fofo, —
coisas que, aliás, não impedem que uma pessoa ame, quando quer amar. Se esta última
reflexão é o motivo secreto da vossa pergunta, deixai que vos diga que sois muito
indiscreta, e que eu não me quero senão com dissimulados.
Repito, comia bem, dormia largo e fofo. Chegara ao fim da comissão das
Alagoas, com elogios da imprensa; a Atalaia chamou-lhe “o anjo da consolação”. E não
se pense que este nome a alegrou, posto que a lisonjeasse; ao contrário, resumindo em
Sofia toda a ação da caridade, podia mortificar as novas amigas, e fazer-lhe perder em
um dia o trabalho de longos meses. Assim se explica o artigo que a mesma folha trouxe
no número seguinte, nomeando, particularizando e glorificando as outras comissárias —
“estrelas de primeira grandeza”.
Nem todas as relações subsistiram. mas a maior parte delas estavam atadas, e
não faltava à nossa dona o talento de as tornar definitivas. O marido é que pecava por
turbulento, excessivo, derramado, dando bem a ver que o cumulavam de favores, que
recebia finezas inesperadas e quase imerecidas. Sofia, para emendá-lo, vexava-o com
censuras e conselhos, rindo:
— “Você esteve hoje insuportável; parecia um criado.”
— “Cristiano, fique mais senhor ele si, quando tivermos gente de fora, não se
ponha com os olhos fora da cara, saltando de um lado para outro, assim com ar de
criança que recebe doce...”
Ele negava, explicava ou justificava-se; afinal, concluía que sim, que era preciso
não parecer estar abaixo dos obséquios; cortesia, afabilidade, mais nada...
— Justo, mas não vás cair no extremo oposto, acudiu Sofia; não vás ficar
casmurro.
Palha era então as duas coisas; casmurro, a princípio, frio, quase desdenhoso;
mas, ou a reflexão, ou o impulso inconsciente, restituía ao nosso homem a animação
habitual, e com ela, segundo o momento, a demasia e o estrépito. Sofia é que, em
verdade, corrigia tudo. Observava, imitava. Necessidade e vocação fizeram-lhe adquirir,
aos poucos, o que não trouxera do nascimento nem da fortuna. Ao demais, estava
naquela idade média em que as mulheres inspiram igual confiança às sinhazinhas de
vinte e às sinhás de quarenta. Algumas morriam por ela; muitas a cumulavam de
louvores.
Foi assim que a nossa amiga, pouco a pouco, espanou a atmosfera. Cortou as
relações antigas, familiares, algumas tão íntimas que dificilmente se poderiam dissolver;
mas a arte de receber sem calor, ouvir sem interesse e despedir-se sem pesar, não era
das suas menores prendas; e uma por uma, se foram indo as pobres criaturas modestas,
sem maneiras, nem vestidos, amizades de pequena monta, de pagodes caseiros, de
hábitos singelos e sem elevação. Com os homens fazia exatamente o que o major
contara, quando eles a viam passar de carruagem, — que era sua, — entre parêntesis. A
diferença é que já nem os espreitava para saber se a viam. Acabara a lua-de-mel da
grandeza; agora torcia os olhos duramente para outro lado, conjurando, de um gesto definitivo, o perigo de alguma hesitação. Punha assim os velhos amigos na obrigação de
lhe não tirarem o chapéu.
CAPÍTULO CXXXIX
RUBIÃO ainda quis valer ao major, mas o ar de fastio com que Sofia o interrompeu foi
tal, que o nosso amigo preferiu perguntar-lhe se, não chovendo na seguinte manhã,
iriam sempre passear à Tijuca,
— Já falei a Cristiano; disse-me que tem um negócio, que fique para domingo
que vem.
Rubião, depois de um instante:
— Vamos nós dois. Saímos cedo, passeamos, almoçamos lá; às três ou quatro
horas estamos de volta...
Sofia olhou para ele, com tamanha vontade de aceitar o convite, que Rubião não
esperou resposta verbal.
— Está assentado, vamos, disse ele.
— Não.
— Como não?
E repetiu a pergunta, porque Sofia não lhe quis explicar a negativa, aliás, tão
óbvia. Obrigada a fazê-lo, ponderou que o marido ficaria com inveja, era capaz de adiar
o negócio, só para ir também. Não queria atrapalhar os negócios dele, e podiam esperar
oito dias. O olhar de Sofia acompanhava essa explicação, como um clarim
acompanharia um padre-nosso. Vontade tinha, oh! se tinha vontade de ir na manhã
seguinte, com Rubião, estrada acima, bem posta no cavalo, não cismando à toa, nem
poética, mas valente, fogo na cara, toda deste mundo, galopando, trotando, parando. Lá
no alto, desmontaria algum tempo; tudo só, a cidade ao longe e o céu por cima.
Encostada ao cavalo, penteando-lhe as crinas com os dedos, ouviria Rubião louvar-lhe a
afoiteza e o garbo... Chegou a sentir um beijo na nuca.